segunda-feira, 11 de outubro de 2010

'Desinformação' não serve à democracia, diz Marilena Chauí

Olá!
O texto que segue abaixo serve como reflexão para os que pensam que todo mundo acredita, ou deveria acreditar, na MÍDIA. Uma pensadora do nível de Marilena Chauí dar este tipo de depoimento me faz pensar que é o fim político para determinados setores (da poplítica) no nosso País. Espero que leiam e reflitam antes do voto final destas eleições.

Em entrevista exclusiva à Rede Brasil Atual, a professora de filosofia da USP aponta setores ruralistas e classe média urbana como focos de anti-Lula. Ela faz reiteradas críticas à ameaça à liberdade de expressão provocada pela concentração dos meios de comunicação
Por: João Peres, Rede Brasil Atual 

 Marilena Chauí pensa que a velha mídia está nos seus estertores. A filósofa e professora da Universidade de São Paulo (USP) entende que o surgimento da internet, o crescimento das alternativas e as atuais eleições delineiam o fim de um modelo.
A professora, que deixou de escrever e de falar para a velha mídia por não concordar com a postura de vários desses veículos, entende que a imprensa tem papel fundamental para a ausência de debate de temas-chave nas atuais eleições, alimentando questões que favorecem à candidatura de José Serra (PSDB).
Ela considera que não é possível falar de democracia quando se tem o poder da comunicação concentrado em poucas famílias, sem que a sociedade tenha a possibilidade de contestação. Após ato pró-Dilma Rousseff (PT), na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, no centro da capital paulista, a filósofa manifestou à Rede Brasil Atual que os ruralistas e a classe média urbana são os setores que alimentam o ódio a Lula.
Marilena Chauí aponta, sempre em meio a muitos gestos e a uma fala enfática, que o presidente jamais será perdoado. O motivo? Combateu a desigualdade no país.
Acompanhe a seguir os principais trechos da entrevista.
Rede Brasil Atual – O único ponto aparente de consenso entre os institutos de pesquisa é quanto à aprovação do governo Lula. Que grupos estão entre os 4% da população que consideram ruim ou péssimo o desempenho do presidente?
Marilena Chauí - É um mistério para mim. Tudo que tenho ouvido, sobretudo no rádio, em entrevistas sobre os mais diversos temas, vai tudo muito bem. Os setores que eu imaginaria que diriam que o governo ruim não são. Surpreendentemente.
Mas há dois setores que são "pega pra capar". Um é evidentemente a agroindústria, mas é assim desde o primeiro governo Lula. Eles formam esse mundo ruralista que o DEM representa. Não são nem adversários, são inimigos. Inimigos de classe.
O segundo setor é a classe média urbana, que está apavorada com a diminuição da desigualdade social e que apostou todas suas fichas na ideia de ascensão social e de recusa de qualquer possibilidade de cair na classe trabalhadora. Ao ver o contrário, que a classe trabalhadora ascende socialmente e que há uma distribuição efetiva de renda, se apavorou porque perdeu seu próprio diferencial. E seu medo, que era de cair na classe trabalhadora, mudou. Foram invadidos pela classe trabalhadora.
Rede Brasil Atual – Os trabalhadores têm reconquistado direitos e, com isso, setores do empresariado reclamam que há risco de perda de competitividade pelo mercado brasileiro.
Marilena Chauí – Isso é uma conversa para a campanha eleitoral. É coisa da Folha, do Estadão, do Globo, da Veja, não é para levar a sério. E se você for lá e pedir para provar (que perderia competitividade), vão dizer que não falaram, que foi fruto das circunstâncias. Eles sabem que é uma piada isso que estão dizendo, não tem qualquer consistência.
Rede Brasil Atual – A senhora passou por uma situação parecida à da psicanalista Maria Rita Kehl, agora dispensada pelo Estadão por ter elogiado o governo Lula...
Marilena Chauí – Não foi parecida porque não fui demitida. Eu disse a eles que me recusava a escrever lá. Tanto no Estado quanto na Folha. Tomei a iniciativa de dizer a eles que não teriam minha colaboração.
Quando li o artigo da Maria Rita Kehl, pensei mesmo que poderia dar algum problema. Como é que o Estadão deixou o artigo sair? Era de se esperar que houvesse uma censura prévia.
Agora, se você tomar o que aconteceu nos últimos oito ou nove anos, vai ver que houve uma peneirada e uma parte das pessoas de esquerda simplesmente desistiu de qualquer relação com a mídia. Outras tiveram relação esporádica em momentos muito pontuais em que era preciso se expressar publicamente.
Houve, em um primeiro momento, um deslocamento das pessoas de esquerda para o Estadão, mas um deslocamento que não tinha como durar porque o jornal não tinha como abrigar esse tipo de pensamento.
Desapareceu para valer qualquer pretensão da mídia até mesmo de se oferecer sob uma perspectiva liberal. E sob uma perspectiva democrática. É formidável que no momento em que dizem que nós, do PT, ameaçamos a liberdade de imprensa, eles demitam a Maria Rita.
O que acho, com o segundo turno das eleições de Lula e as eleições da Dilma, é que há um estilo de mídia que está nos seus estertores. O fato de que haja internet e mídia alternativa que se espalha pelo Brasil inteiro muda completamente o padrão.
Passa-se de jornais que tinham função de noticiar para jornais que têm a função de opinar, o que é um contrassenso. A busca pela notícia faz com que não se vá mais em direção ao jornal, vá se buscar em outros lugares.
Rede Brasil Atual – Em períodos eleitorais, tem sido recorrente a associação entre mídia e partidos políticos. Qual a implicação disso na tentativa de consolidação da democracia?
Marilena Chauí – Isso é o que atrapalha a democracia do ponto de vista da liberdade do pensamento e de expressão. O que caracteriza uma sociedade democrática é o direito de produzir informação e de receber informação, de modo que possa circular, ser transformada. O que se tem é a ausência da informação, a manipulação da opinião e a mentira.
Acabo de ver em um site a resposta do Marco Aurélio Garcia (um dos coordenadores de campanha de Dilma) à manchete da Folha. Como é que a Folha dá manchete falando que Dilma vai tirar a questão do aborto do programa de governo se essa questão não está no programa? É dito qualquer coisa.
"Desapareceu o compromisso mínimo com a verdade, o compromisso mínimo com a informação. É uma coisa de partido, puramente ideológica, perversa, de produção da mentira. (...) A desinformação. Isso não serve para a democracia." – Marilena Chauí
Desapareceu o compromisso mínimo com a verdade, o compromisso mínimo com a informação. É uma coisa de partido, puramente ideológica, perversa, de produção da mentira. Isso me lembra muito um ensaio que Hannah Arendt escreveu na época da Guerra do Vietnã. Ela comentava as mentiras que a TV, o rádio e os jornais apresentavam. Apresentavam a vitória no Vietnã, até o instante em que a mentira encontrou um limite tal nos próprios fatos que a verdade teve que aparecer. Ela chamou isso de crise da República, que é quando tem a mentira no lugar da informação. Ou seja, a desinformação. Isso não serve para a democracia.
Rede Brasil Atual - O governo Lula teve, internamente, a convivência de polos opostos. Talvez tenha sido o primeiro a ter, por exemplo, Ministério de Desenvolvimento Agrário voltado a agricultura familiar e dialogando com o MST e o Ministério da Agricultura, voltado para o agronegócio. O governo e o presidente se saíram bem na tarefa de fazer opostos conviverem?
Marilena Chauí - Sim. E isso é um talento peculiar que o presidente Lula tem, de ser um negociador nato. Como uma boa parte do trabalho do governo foi feita pela Casa Civil, podemos dizer que Dilma Rousseff tem a capacidade de fazer esse trânsito e essa negociação.
Rede Brasil Atual - Mas como explicar as reações provocadas?
Marilena Chauí - Duas coisas são muito importantes com relação ao atual governo. A primeira é que o governo Lula jamais será perdoado por ter enfrentado a questão da desigualdade social. Lula enfrentou a partir da própria figura dele. O fato de você ter um presidente operário, que tem o curso primário (Lula tem o ensino médio completo), significou a ruína da ideologia burguesa. Todos os critérios da ideologia burguesa para ocupar este posto (Presidência da República), que é ser da elite financeira, ter formação universitária, falar línguas estrangeiras, ter desempenho de gourmet... Enfim, foi descomposta uma série de atrativos que compõem a figura que a burguesia compôs para ocupar a Presidência. Ponto por ponto.
A burguesia brasileira e a classe média protofascista nunca vão perdoar isso ter acontecido. Imagine como eles se sentem. Houve (Nelson) Mandela, Lula, (Barack) Obama, (Hugo) Chávez. É muita coisa para a cabeça deles. É insuportável. É a sensação de fim de mundo.
Tudo que fosse possível fazer para destruir esse governo foi feito. Por que não caiu? Não caiu porque foi capaz de operar a negociação entre os polos contrários. Isso é uma novidade no caso do Brasil porque, normalmente, opera-se por exclusão. O que o governo fez foi operar por entendimento. E a possibilidade de corrigir uma coisa pela outra.
Agora, há milhares de problemas que o próximo governo vai ter de enfrentar. Não podemos cobrar de nós mesmos que façamos em oito ou em 16 anos o que não foi feito em 500. Mas quando se olha o que já foi feito, leva-se um susto. A redução da desigualdade, a inclusão no campo dos direitos de milhões de pessoas, o Luz para Todos, a casa (Minha Casa, Minha Vida), o Bolsa-Família, a (geração de empregos com) carteira assinada... É uma coisa nunca feita no Brasil.
Rede Brasil Atual - A sra. faz uma avaliação muito positiva do governo. Por que essas medidas não ocorreram antes?
Marilena Chauí - Alguém tinha de vir das classes trabalhadoras para dizer o que precisa fazer no Brasil. Os governos anteriores sequer levavam em conta que isso existia. O máximo que existia era o incômodo de ver essa gente pela rua, embaixo da ponte, fazendo greve, no ponto de ônibus, caindo pelas tabelas na condução pública. Era uma coisa assim que incomodava - (diziam:) "é meio feio, né? É antiestético". O máximo de reação que a presença de classes populares causava era por serem antiestéticos. É a primeira vez que essa classe foi levada a sério.
Eles vão estrebuchar, vão gritar, vão xingar. Vão pintar a saracura, como diria minha mãe. Mas é isso aí. Deixa pintar a saracura que nós ficamos em pé.


Um abraço e até!


sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Professores e Pesquisadores de Filosofia Apoiam Dilma Rousseff para a Presidência da República

Olá!

Mesmo com essa mídia brasileira horrorosa, golpísta, finalmente algum segmento da sociedade apoia a candidatura da Companheira Dilma. Segue na íntegra o Manifesto.


Professores
e pesquisadores de Filosofia, abaixo assinados, manifestamos nosso
apoio à candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República.
Seguem-se nossas razões.

Os valores de
nossa Constituição exigem compromisso e responsabilidade por parte dos
representantes políticos e dos intelectuais

Nesta
semana completam-se vinte e dois anos de promulgação da Constituição
Federal. Embora marcada por contradições de uma sociedade que recém
começava a acordar da longa noite do arbítrio, ela logrou afirmar
valores que animam sonhos generosos com o futuro de nosso país. Entre os
objetivos da República Federativa do Brasil estão “construir uma
sociedade livre, justa e solidária”, “garantir o desenvolvimento
nacional”, “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais”.

A vitalidade de nossa República depende do efetivo
compromisso com tais objetivos, para além da mera adesão verbal. Por
parte de nossos representantes, ele deve traduzir-se em projetos claros e
ações efetivas, sujeitos à responsabilização política pelos cidadãos.
Dos intelectuais, espera-se o exame racionalmente responsável desses
projetos e ações.

Os oito anos de governo Lula constituíram um formidável
movimento na direção desses objetivos. Reconheça-se o papel do governo
anterior na conquista de relativa estabilidade econômica. Ao atual
governo, porém, deve-se tributar o feito inédito de conciliar
crescimento da economia, controle da inflação e significativo
desenvolvimento social. Nesses oito anos, a pobreza foi reduzida em mais
de 40%; mais de 30 milhões de brasileiros ascenderam à classe média; a
desigualdade de renda sofreu uma queda palpável. Não se tratou de um
efeito natural e inevitável da estabilidade econômica. Trata-se do
resultado de políticas públicas resolutamente implementadas pelo atual
governo – as quais não se limitam ao Bolsa Família, mas têm nesse
programa seu carro-chefe.

Tais políticas assinalam o compromisso do governo Lula com a
realização dos objetivos de nossa República. Como ministra, Dilma
Rousseff exerceu um papel central no sucesso dessa gestão. Cremos que
sua chegada à Presidência representará a continuidade, aprofundamento e
aperfeiçoamento do combate à pobreza e à desigualdade que marcou os
últimos oito anos.

Há razões para duvidar que um eventual governo José Serra
ofereça os mesmos prospectos. É notório o desprezo com que os programas
sociais do atual governo – em particular o Bolsa Família – foram
inicialmente recebidos pelos atores da coligação que sustenta o
candidato. Frente ao sucesso de tais programas, José Serra vem agora
verbalizar sua adesão a eles, quando não arroga para si sua primeira
concepção. Não tendo ainda, passado o primeiro turno, apresentado um
programa de governo, ele nos lança toda sorte de promessas – algumas das
quais em franco contraste com sua gestão como governador de São Paulo –
sem esclarecer como concretizá-las. O caráter errático de sua campanha
justifica ceticismo quanto à consistência de seus compromissos. Seu
discurso pautado por conveniências eleitorais indica aversão à
responsabilidade que se espera de nossos representantes. Ironicamente,
os intelectuais associados ao seu projeto político costumam tachar o
governo Lula e a candidatura Dilma de populistas.

O compromisso com a inclusão social é um
compromisso com a democracia


A despeito da súbita conversão da oposição às políticas
sociais do atual governo, ainda ecoam entre nós os chavões disseminados
por ela sobre os programas de transferência de renda implementados nos
últimos anos: eles consistiriam em mera esmola assistencialista
desprovida de mecanismos que possibilitem a autonomia de seus
beneficiários; mais grave, constituiriam instrumento de controle
populista sobre as massas pobres, visando à perpetuação no poder do PT e
de seus aliados. Tais chavões repousam sobre um equívoco de direito e
de fato.

A história da democracia, desde seus primeiros momentos na
pólis ateniense, é a história da progressiva incorporação à comunidade
política dos que outrora se viam destituídos de voz nos processos
decisórios coletivos. Que tal incorporação se mostre efetiva pressupõe
que os cidadãos disponham das condições materiais básicas para seu
reconhecimento como tais. A cidadania exige o que Kant caracterizou como
independência:
o cidadão deve ser “seu próprio senhor (
sui
iuris
)”, por conseguinte possuir “alguma propriedade (e qualquer
habilidade, ofício, arte ou ciência pode contar como propriedade) que
lhe possibilite o sustento”. Nossa Constituição vai ao encontro dessa
exigência ao reservar um capítulo aos direitos sociais.

Os programas de
transferência de renda implementados pelo governo não apenas ajudaram a
proteger o país da crise econômica mundial – por induzirem o crescimento
do mercado interno –, mas fortaleceram nossa democracia ao criar bases
concretas para a cidadania de milhões de brasileiros. Se atentarmos ao
seu formato institucional, veremos que eles proporcionam condições para a
progressiva autonomia de seus beneficiários, ao invés de prendê-los em
um círculo de dependência. Que mulheres e homens beneficiados por tais
programas confiram seus votos às forças que lutaram por implementá-los
não deve surpreender ninguém – trata-se, afinal, da lógica mesma da
governança democrática. Senhoras e senhores de seu destino, porém, sua
relação com tais forças será propriamente
política, não mais a subserviência em que os confinavam as
oligarquias.

As liberdades públicas
devem ser protegidas, em particular de seus paladinos de ocasião


Nos últimos oito anos –
mas especialmente neste ano eleitoral – assistiu-se à reiterada
acusação, por parte de alguns intelectuais e da grande imprensa, de que o
presidente Lula e seu governo atentam contra as liberdades públicas. É
verdade que não há governo cujos quadros estejam inteiramente imunes às
tentações do abuso de poder; é justamente esse fato que informa o
desenvolvimento dos sistemas de freios e contrapesos do moderno Estado
de Direito. Todavia, à parte episódios singulares – seguidos das sanções
e reparos cabíveis –, um olhar sóbrio sobre o nosso país não terá
dificuldade em ver que o governo tem zelado pelas garantias fundamentais
previstas na Constituição e respeitado a independência das instituições
encarregadas de protegê-las, como o Ministério Público, a Procuradoria
Geral da República e o Supremo Tribunal Federal.

Diante disso, foi com
desgosto e preocupação que vimos personalidades e intelectuais ilustres
de nosso país assinarem, há duas semanas, um autointitulado “Manifesto
em Defesa da Democracia”, em que acusam o governo de tramas para
“solapar o regime democrático”. À conveniência da candidatura
oposicionista, inventam uma nova regra de conduta presidencial: o
Presidente da República deve abster-se, em qualquer contexto, de fazer
política ou apoiar candidaturas. Ironicamente, observada tal regra seria
impossível a reeleição para o executivo federal – instituto criado
durante o governo anterior, não sem sombra de casuísmo, em
circunstâncias que não mereceram o alarme da maioria de seus
signatários.

Grandes veículos de comunicação sistematicamente alardeiam
que o governo Lula e a candidatura Dilma representam uma ameaça à
liberdade de imprensa, enquanto se notabilizam por uma cobertura
militante e nem sempre responsável da atual campanha presidencial. As
críticas do Presidente à grande imprensa não exigem adesão, mas tampouco
atentam contra o regime democrático, em que o Presidente goza dos
mesmos direitos de todo cidadão, na forma da lei. Propostas de
aperfeiçoamento dos marcos legais do setor devem ser examinadas com
racionalidade, a exemplo do que tem acontecido em países como a França e
a Inglaterra.

Se durante a campanha do primeiro turno houve um episódio a
ameaçar a liberdade de imprensa no Brasil, terá sido o estranho
requerimento da Dra. Sandra Cureau, vice-procuradora-geral Eleitoral, à
revista Carta Capital. De efeito intimidativo e duvidoso lastro legal, o
episódio não recebeu atenção dos grandes veículos de comunicação do
país, tampouco ensejou a mobilização cívica daqueles que, poucos dias
antes, publicavam um manifesto contra supostas ameaças do Presidente à
democracia brasileira. O zelo pelas liberdades públicas não admite dois
pesos e duas medidas. Quando a evocação das garantias fundamentais se vê
aliciada pelo vale-tudo eleitoral, a Constituição é rebaixada à mera
retórica.

Estamos convictos de que Dilma Rousseff, se eleita, saberá
proteger as liberdades públicas. Comprometidos com a defesa dessas
liberdades, recomendamos o voto nela.

Em defesa do Estado laico e do respeito à diversidade de
orientações espirituais, contra a instrumentalização política do
discurso religioso


A Constituição Federal é suficientemente clara na afirmação
do caráter laico do Estado brasileiro. É garantida aos cidadãos
brasileiros a liberdade de crença e consciência, não se admitindo que
identidades religiosas se imponham como condição do exercício de
direitos e do respeito à dignidade fundamental de cada um. Isso não
significa que a religiosidade deva ser excluída da cena pública; exige,
porém, intransigência com os que pregam o ódio e a intolerância em nome
de uma orientação espiritual particular.

É, pois, com
preocupação que testemunhamos a instrumentalização do discurso religioso
na presente corrida presidencial. Em particular, deploramos a guarida
de templos ao proselitismo a favor ou contra esta ou aquela candidatura –
em clara afronta à legislação eleitoral. Dilma Rousseff, em particular,
tem sido alvo de campanha difamatória baseada em ilações sobre suas
convicções espirituais e na deliberada distorção das posições do atual
governo sobre o aborto e a liberdade de manifestação religiosa.
Conclamamos ambos os candidatos ora em disputa a não cederem às
intimidações dos intolerantes. Temos confiança de que um eventual
governo Dilma Rousseff preservará o caráter laico do Estado brasileiro e
conduzirá adequadamente a discussão de temas que, embora sensíveis a
religiosidades particulares, são de notório interesse público.

O compromisso com a expansão e qualificação da universidade é
condição da construção de um país próspero, justo e com desenvolvimento
sustentável


É incontroverso que a prosperidade de um país se deixa medir
pela qualidade e pelo grau de universalização da educação de suas
crianças e de seus jovens. O Brasil tem muito por fazer nesse sentido,
uma tarefa de gerações. O atual governo tem dado passos na direção
certa. Programas de transferência de renda condicionam benefícios a
famílias à manutenção de suas crianças na escola, diminuindo a evasão no
ensino fundamental. A criação e ampliação de escolas técnicas e
institutos federais têm proporcionado o aumento de vagas públicas no
ensino médio. Programas como o PRODOCENCIA e o PARFOR atendem à
capacitação de professores em ambos os níveis.

Em poucas áreas da
governança o contraste entre a administração atual e a anterior é tão
flagrante quanto nas políticas para o ensino superior e a pesquisa
científica e tecnológica associadas. Durante os oito anos do governo
anterior, não se criou uma nova universidade federal sequer; os
equipamentos das universidades federais viram-se em vergonhosa penúria;
as verbas de pesquisa estiveram constantemente à mercê de
contingenciamentos; o arrocho salarial, aliado à falta de perspectivas e
reconhecimento, favoreceu a aposentaria precoce de inúmeros docentes,
sem a realização de concursos públicos para a reposição satisfatória de
professores. O consórcio partidário que cerca a candidatura José Serra –
o mesmo que deu guarida ao governo anterior – deve explicar por que e
como não reeditará essa situação.

O atual governo tem agido não apenas para a recuperação do
ensino superior e da pesquisa universitária, após anos de sucateamento,
como tem implementado políticas para sua expansão e qualificação – com
resultados já reconhecidos pela comunidade científica internacional. O
PROUNI – atacado por um dos partidos da coligação de José Serra –
possibilitou o acesso à universidade para mais de 700.000 brasileiros de
baixa renda. Através do REUNI, as universidades federais têm assistido a
um grande crescimento na infraestrutura e na contratação, mediante
concurso público, de docentes qualificados. Programas de fomento,
levados a cabo pelo CNPq e pela CAPES, têm proporcionado um sensível
aumento da pesquisa em ciência e tecnologia, premissa central para o
desenvolvimento do país. 
Foram
criadas 14 novas universidades federais, testemunhando-se a
interiorização do ensino superior no Brasil, levando o conhecimento às
regiões mais pobres, menos desenvolvidas e mais necessitadas de apoio do
Estado.

Ademais, deve-se frisar que não há possibilidade de
desenvolvimento sustentável e preservação de nossa biodiversidade –
temas cujo protagonismo na atual campanha deve-se à contribuição de
Marina Silva – sem investimentos pesados em ciência e tecnologia. Não se
pode esperar que a iniciativa privada satisfaça inteiramente essa
demanda. O papel do Estado como indutor da pesquisa científica é
indispensável, exigindo um compromisso que se traduza em políticas
públicas concretas. A ausência de projetos claros e consistentes da
candidatura oposicionista, a par do lamentável retrospecto do governo
anterior nessa área, motiva receios quanto ao futuro do ensino superior e
do conhecimento científico no Brasil – e, com eles, da proteção de
nosso meio-ambiente – no caso da vitória de José Serra. A perspectiva de
continuidade e aperfeiçoamento das políticas do governo Lula para o
ensino e a pesquisa universitários motiva nosso apoio à candidatura de
Dilma Rousseff.

Por essas razões,
apoiamos a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República.
Para o povo brasileiro continuar em sua jornada de reencontro consigo
mesmo. Para o Brasil continuar mudando!

06 de outubro de 2010

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Candidatura a Presidencia do PCB

Olá!

Às vezes fico pensando em qual seria a melhor revolução para um Brasil melhor. Não acredito mais nas eleições por voto, qual é a representatividade de um candidato? São bastante interessantes as idéias do "Partidão" (PCB). Pena, como já disse, que não acredito na representatividade. A desigualdade existe até na hora em que os candidatos vão se apresentar. Mas, voltando ao Partidão, Leiam a Entrevista do Ivan Pinheiro ao ESHoje, do Espírito santo.  Um abraço, Blarg e boa leitura!

 

Ivan Pinheiro quer acabar com autonomia do Banco Central e suspender o pagamento da dívida externa

Em visita a Vitória, o presidenciável pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB) apresentou propostas, segundo ele, para um "Estado forte, eficiente e a serviço dos anseios populares"
Por Priscila Bueker (pbueker@eshoje.com.br) Fotos: Leonardo Sá.
A praticamente uma semana antes das eleições, chegou a vez de outro presidenciável trazer ao eleitor capixaba suas propostas e projeto de governo. Na tarde desta segunda-feira (27), o Partido Comunista Brasileiro (PCB), trouxe ao Espírito Santo o presidenciável, o advogado carioca, Ivan Pinheiro. O candidato fez corpo a corpo no Centro de Vitória e, em seguida, se reuniu com o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Espírito Santo(OAB-ES), Homero Mafra.
De acordo com Pinheiro, o partido comunista, um dos mais antigos do Brasil, tem por filosofia construir o poder popular e avançar na luta pelo socialismo no país. Dos 27 Estados Brasileiros, o partido está organizado em 21 deles. Destes, em 19 o PCB tem candidatos disputando vaga em todos os níveis. O partido não tem representatividade em âmbito capixaba. Porém, de acordo com o candidato, o PCB promove uma campanha política de caráter revolucionário e não apenas eleitoral.
Declaradamente de esquerda, contra as desigualdades geradas pelo sistema capitalista, Pinheiro ressalta que, na possibilidade de ser eleito, tomaria uma primeira medida: a suspensão do pagamento da dívida externa, para promover uma auditoria. Para ele, o governo Lula conseguiu avançar, mas dentro dos moldes capitalistas, dando lucro só para os bancos.
"O Brasil gasta 35% do orçamento corrente para pagar dívida. Eu acabaria com isso, como também, com a autonomia do banco central e fortaleceria os bancos públicos estaduais. Uma outra proposta é reestatizar algumas estatais estratégicas que foram privatizadas no governo FHC, como a Vale do Rio Doce. O capitalismo vive uma crise sistêmica. Nós estamos em um Estado patrimonialista, aparelhado. Só o socialismo seria capaz de combater esta desigualdade econômico-social", declarou.
Na área social, o candidato comunista criticou o bolsa-familía como sendo uma medida compensatória, mas que o próximo presidente terá que mantê-lo. "O bolsa-família é uma política que não tem porta de saída. Ele evita que as pessoas passem fome, e por isso, o próximo presidente terá que dar continuidade. Minha proposta é transformar o bolsa família, de esmola, para um elemento propulsor de educação, saúde e desenvolvimento. Nós iríamos estudar para ver como isso seria implantado", ressaltou.
Pinheiro acredita que algumas medidas deveriam ser tomadas para que se alcance a verdadeira igualdade social. Dentre elas, a redução da jornada de trabalho sem redução salarial, o fim do fator previdenciário,  a reforma agrária,  a erradicação do analfabetismo e  a polêmica legalização do aborto. De acordo com o presidenciável, mais do que construir um novo país, ele o pretende fazer juntamente com os trabalhadores e o povo. Quanto à  própria organização política, o candidato defende uma reforma, com plebiscitos e referendos sobre temas de interesse nacional e um Congresso unicameral, com extinção do Senado.
"A continuidade do capitalismo é uma ameaça à própria vida, à natureza e à espécie humana. Este sistema está completamente falido e somente uma grande frente anticapitalista e anti-imperialista, envolvendo organizações políticas, movimentos populares e setores progressistas da sociedade, será capaz de lutar pelas transformações sociais, econômicas e políticas necessárias para a superação deste sistema. Somos contra à supervalorização do dinheiro e a favor da vida e do desenvolvimento social", enfatiza.
 
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Desigualdade na campanha. De acordo com o presidenciável comunista, o advogado Ivan Pinheiro, o fato de sua campanha ser menor, em vista dos concorrentes Dilma Roussef (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV), não atrapalha na divulgação e no acolhimento  de suas idéias de campanha. Para ele, o PCB cumpre seu papel que é o de trazer uma nova alternativa e de qualificar o debate.
"Quando registramos nossa chapa, não tínhamos nenhuma ilusão de que a mídia nos beneficiaria, até porque somos contra essa política imperialista, dos grandes empresários, a qual ela faz parte. Estamos na semana anterior à eleição, e quanto a Dilma e o Serra, um gastou R$ 180 mi e o outro R$ 200 mi em campanha. Nós gastamos R$200 mil. Mas, nossa maior satisfação está em levar para o eleitor um novo projeto político, ideológico, doutrinário socialista condizente com o desejo popular", explicou Pinheiro.
Ele ainda explica que um segundo objetivo de sua campanha está relacionado à organização do partido. "Logicamente precisamos do seu voto, mas está sendo ótimo percorrer o Brasil e ver que nossa campanha está sendo bem aceita. O Partido Comunista Brasileiro teve uma cisão em 1992 , do qual originou o Partido Popular Socialista(PPS). Só que ficamos em desvantagem, algumas pessoas até achavam que o partido tinha acabado. Em 1996, conquistamos nosso registro e foi agora, a partir de 2005, que voltamos a nos organizar efetivamente. Creio que em breve teremos candidatos aqui no Estado", ponderou.
2° turno. Sobre um possível 2° turno entre a petista, Dilma Roussef(PT) e o tucano, José Serra (PSDB), Pinheiro não acredita que aconteça na atual conjuntura. Ele explica que, caso ocorra, o PCB terá uma árdua tarefa ao definir seu apoio. Para Pinheiro, a diferença entre o Partido dos Trabalhadores e o Partido da Social Democracia está ficando cada vez menor.
"O governo Lula avançou, não nego. Será que haverá um 2 ° turno? Duvido. Pois para nós, a escolha será difícil. Em 2006 apoiamos Lula , porque entre ele e Geraldo Alckmin, ele era menos pior. Sinto também que, caso aconteça este segundo pleito, pode ser entre duas candidatas mulheres. É o que sinto nas ruas", disse.
Sobre os resultados das campanhas, o candidato é enfático: "Vamos analisar com carinho nosso apoio, caso aconteça esse 2° turno. O fato é que este pleito é totalmente desigual, inclusive para nós.Uma pesquisa revelou que, ao final destas eleições, 98% dos eleitores sairão sabendo quem são Serra, Dilma, por exemplo, e suas propostas, partidos e idéias. Enquanto que, quanto aos partidos de esquerda, apenas 5% sabem de nossas idéias, projetos e relação com o Governo Lula", finalizou.

domingo, 19 de setembro de 2010

Leonardo Boff: "João Paulo II e Bento XVI afastaram a Igreja do mundo"

Olá!

Segue a entrevista de Leonardo Boff para a Revista Época.

O teólogo Leonardo Boff é um dos maiores críticos brasileiros ao comportamento recente da Igreja Católica. Expoente da Teologia da Libertação, foi expulso da Igreja nos anos 80, por criticar sistematicamente a hierarquia da religião. Doutor em Filosofia e Teologia pela Universidade de Munique, Boff falou a ÉPOCA sobre os principais motivos da grande perda de fiéis da Igreja Católica para as evangélicas e pentecostais no Brasil e fez críticas ao movimento carismático, comandado pelos padres Marcelo Rossi e Fábio de Melo. "Eles são animadores de auditório. Isso não leva ninguém à transformação. É um Lexotan".
ÉPOCA – O Papa Bento XVI reconheceu, no último dia 10, a enorme perda de fiéis da Igreja Católica no Brasil e a rápida expansão das evangélicas e pentecostais. A que se deve isso?
Leonardo Boff -
São três causas. Primeiro, a Igreja não consegue ter padres suficientes pra atender fiéis, por causa do celibato. São 17 mil, e teriam de ser uns 120 mil. As pentecostais ocupam esse vazio. Elas vão ao encontro das demandas do povo. O povo não é dogmático, vai pro centro espírita, vai pra macumba... Em segundo lugar, a grande desmoralização que a igreja sofreu com os padres pedófilos. É a maior crise desde a Reforma Protestante. É uma crise grave, porque se desmoralizou e perdeu o conteúdo ético. A maneira como o Vaticano se comportou foi desastrosa. Tentou encobrir e depois disse que era um complô internacional. Só quando começaram a aparecer muitos casos que o papa disse que tinha que punir. Mas, mesmo assim, não mostrou solidariedade com as vítimas e nem como mudar isso. Só pensa na Igreja. Em terceiro lugar, o fato de a Igreja ter uma visão muito abstrata da realidade. Uma linguagem que o povo não entende direito.
ÉPOCA – O senhor acredita que nas últimas décadas houve um retrocesso na modernização da Igreja Católica?
Boff -
João Paulo II e Bento XVI abortaram as inovações de João Paulo I e afastaram a Igreja do mundo. A Igreja não tem dialogo com as outras igrejas. Falta uma reconciliação com o mundo moderno. Desde o século XVI que a Igreja vive em briga com ele. A igreja se abriu a isso e João Paulo II, com sua visão medieval, abortou tudo isso. A Igreja não tem mais poder político. Só tem poder moral. Reforçou a estrutura hierárquica tradicional. Marginaliza mulheres, e os fiéis têm a representatividade de garis. A igreja dos anos 60 aos 80, quando surgiram a Teologia da Libertação e os movimentos de base, foi abortada. Isso tornou a igreja antipática.
ÉPOCA – O que os católicos encontram nas outras igrejas que não encontram na Católica?
Boff -
O povo quer uma mensagem compreensível e simples. As evangélicas utilizam os instrumentos do mercado e são muito calcadas em cima da prosperidade. Há uma grande manipulação das expectativas e do sentimento religioso do povo. Mas, ao mesmo tempo, elas são formas de ordenar a sociedade. Muitas famílias que viviam nas drogas e na bebedeira se estruturaram, se inseriram na sociedade. Fator de ordem.
ÉPOCA – Bento XVI disse que os padres não estão evangelizando suficientemente os fiéis e que as pessoas se tornam influenciáveis e com uma fé frágil. O senhor concorda?
Boff -
O problema não é evangelizar. É a maneira como se faz. O catecismo e outros símbolos imutáveis são engessados, não falam no fundo das pessoas. É um cristianismo fúnebre. O padre Marcelo Rossi está imitando as pentecostais. Há um vazio de evangelização, é a relação pessoa e Deus. É melhor escutar o padre Rossi do que escutar a Xuxa, mas é a mesma coisa. Eles são animadores de auditório. Isso não leva ninguém à transformação. É um Lexotan. Depois volta a lógica dura da vida. É uma evangelização desgarrada da vida concreta.
ÉPOCA – O papa já se não ser muito favorável aos líderes mais carismáticos, como Marcelo Rossi e Fábio de Melo. Isso não complica as coisas?
Boff -
O Vaticano e os bispos não gostam de ter sombra ao lado deles. E Roma não gosta disso. Por isso quer enquadrá-los. Eles são modernos e mercadológicos. Por outro lado, não levam as pessoas a refletirem sobre os problemas do mundo. O padre Rossi nunca fala dos desempregados e da fome. Só convida a dançar. Ele louva as rosas, mas esquece o jardineiro que as rega.
ÉPOCA – Qual seria a melhor forma de atrair quem anda distante da Igreja Católica?
Boff -
A melhor forma é aquilo que a Igreja da Libertação faz desde os anos 70. Reunir cristãos pra confrontar a página da Bíblia com a da vida. Uma evangelização ligada ao cotidiano e às culturas locais. Uma coisa no Nordeste, outra na Coreia. Essa visão proselitista é ofensiva à liberdade humana.
ÉPOCA – Essa tendência de crescimento das outras igrejas se reflete em outros países tradicionalmente católicos. Ela é universal?
Boff -
É um fenômeno mundial chamado imigração interna do cristianismo. Muitos cristãos da Europa que estudaram estão migrando de igreja. Não aceitam esse tipo de igreja. O cristianismo na Europa é agônico. A Alemanha, por exemplo, que tem o imposto religioso, o destina para a luta contra a aids. É outra visão. Tanto que a maior religião do mundo já é a mulçumana, que cresce muito na África. É simples. Não tem padre, nem bispo. Atrai muito mais as pessoas.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Depoimento de quem viveu no Irã

Olá!

Que a imprensa golpista fala e escreve todos nós conhecemos, mas conhecer "in loco" um país como o Irã é outra coisa. Eis o que aconteceu com  a escritora Soni Bonzi. O artigo abaixo foi publicado no site  http://www.novae.inf.br/site/modules.php?name=Conteudo&pid=605   
Ter outros olhares sobre a mesma informação é verdadeiramente a melhor maneira de obter conhecimento real.


"O Irã que eu conheci

Por Sonia Bonzi
Depois de ter morado no Irã, minha maneira de ver o mundo mudou bastante. Não acredito em mais nada do que diz a grande mídia.
Quando soube que ia morar em Teerã senti um certo medo, mas aceitei o desafio. Comecei uma busca voraz por informações sobre o país, a cidade, a história, o povo. Depois de tudo que li, decidi que viveria em casa, reclusa, lendo, escrevendo, fazendo crochet, inventando moda...
Parti de Londres pronta para o sacrifício. Teria que conviver com os xiitas radicais, terroristas cruéis, apedrejadores de mulheres, exterminadores de homossexuais, homens-bomba, mulheres oprimidas, cobertas com véus...
Eu estava submetida às leis locais e me seria vedado mostrar cabelos, pernas e braços. Ficar em casa era o que mais me atraia. Vestir um chador para sair me parecia um pouco demais. A caminho de Teerã eu depositava o sucesso da minha estadia nos jardins da casa onde fui morar. Ter aquele espaço me bastaria.
Logo ao sair do aeroporto comecei a ter uma imagem diferente de tudo aquilo que eu tinha lido. Tudo tão bonito, belas estradas, muita luz, viadutos com mosaicos, jardins bem cuidados, gente vendendo flores nos sinais, um engarrafamento sem buzinas, pedestres poderosos cruzando entre os carros, rapaziada de cabelo espetado, mocinhos com camisetas apertadinhas, moças lindas, super produzidas e também muitas mulheres de chador. Parques cheios de gente. Muita criança. Muito pic nic.
Dizem que a primeira impressão é a que vale. Gostei da chegada. Não tive medo. Não vi tanques, cadafalsos, escoltas armadas... Gostei das caras, das montanhas, das casas, das árvores, dos muros, do alfabeto que me tornava analfabeta.
Logo no segundo dia eu já tinha entendido que minha leitura sobre o cotidiano não tinha nada de realidade. Eu não precisava usar chador. Podia sair vestida com uma calça comprida, um camisão de mangas compridas e um lenço na cabeça. Senti-me nos anos 70, quando eu não dispensava um lencinho.
Deixei o jardim de casa e fui conhecer Teerã.
A imprensa e os meios de comunicação do ocidente me deixavam confusa. O que eu lia e ouvia não correspondi ao que eu vivia e via.
Encontro um povo é acolhedor, educado, culto, simpático, que gosta de fazer amigos, que abre as portas de casa para os estrangeiros, gosta de música, de dança, de declamar poesia... Não encontrei os problemas de abastecimento que me informaram haveria. Comprava-se de tudo, inclusive uísque e vodka. Bastava um telefonema.
Os temíveis homens-bomba nunca passaram por lá. Ninguém se explodia. Foi horrível constatar que enforcamentos aconteciam de vez em quando. Apedrejamento de mulher adúltera já não acontecia há 14 anos.
Fiquei amiga de muitos gays, fiz e fui a festas espetaculares, tomei vinho feito em casa, viajei sem escoltas pelo país, visitei amigos em suas casas de campo, de praia, de montanha...
Apaixonei-me pela culinária refinadíssima, morro de saudades das nozes, pistaches, castanhas, avelãs, frutas secas. Não me esqueço dos pães, do iogurte, do suco de romã puro ou com vodka...
Conheci a Pérsia profunda: lagos salgados, desertos salgados, as antigas capitais, segui a "rota da seda", dormi em caravanserais... Sempre assessorada por amigos locais.
Não conheci um iraniano, de nenhuma classe social, que fosse favorável ao regime teocrático instalado no país. Só uma coisa aproxima o povo do governo: o direito à tecnologia nuclear.
A pressão do ocidente fortalece e radicaliza os aiatolás. O povo do Irã não aceita esta interferência mundial. Quem são os ocidentais para dizer a eles o que fazer? Eles não vem o ocidente como um modelo a ser seguido. Eles não acreditam nos governos que já apoiaram Sadam Hussein numa guerra contra eles. Eles não tem razão para acreditar nas grandes potências. Isto incomoda. Melhor demonizá-los. Eles são acusados de não cumprirem acordos. Quem os acusa também não cumpre.
O domínio da tecnologia nuclear é considerado pelo povo do Irã como um direito deles, que sempre tiveram grandes cientistas, que sempre valorizaram o conhecimento, a medicina de ponta, que querem vender energia nuclear..
O povo iraniano não começa uma guerra há mais de 200 anos. Eles não são belicosos. São diferentes de seus vizinhos. A instabilidade no Oriente Médio não é causada pelo Irã. Apesar da força que a imprensa, os governos, as corporações fazem para denegrir a imagem do Irã, eu confesso que o Irã que eu conheci não é o que é descrito pela mídia ocidental.
Não há favelas em Teerã, não há miseráveis pelas ruas. Minorias tem seus representantes no Congresso, judeus tem seus negócios, suas sinagogas, zoroastrianos tem acesa a chama em seus templos. A família é uma instituição valorizada. Refugiados palestinos e iraquianos são mantidos pelo governo e pelo povo iraniano, que lhes oferece abrigo, alimento e escolas...
Não acredito que ameaças e o uso da força possam melhorar a situação na região. Os iranianos não são os iraquianos. Ser mártir para defender a religião ou a pátria é motivo de júbilo até para as mães.
A negociação, o respeito, a falta de arrogância, as informações corretas são as armas para defender a estabilidade no mundo. Pena que muitos interesses financeiros estejam acima dos sonhos de bem-estar e paz."
A escritora Sonia Bonzi é uma das mais antigas colaboradoras da NovaE, escrevendo do Irã e de vários países do mundo.


Um abraço, blarg, e até!

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Oriente Médio: a vez da Rússia?

 Olá!

Sempre que encontro leituras interessantes post no blogger. Esta matéria do  Robert Fisk, no The Independent, com Tradução: Caia Fittipaldi e Vila Vudu é uma destas surpresas, espero que gostem.

Eu sempre disse que em algum lugar do outro lado do Atlântico – ou talvez em algum lugar pelo Mediterrâneo – passa uma linha geopolítica pontilhada, talvez uma cortina, uma espécie de tela, através da qual o amável velho Ocidente (que já foi chamado de “a cristandade”) vê o Oriente Médio e interpreta errado tudo que vê. O Irã faz uma oferta pacífica e de pacificação para resolver seu programa nuclear, e a oferta é convertida em ameaça e motivo para sanções. Eleições à vista no Egito são vistas como mais um passo rumo à democracia, não como movimento para prolongar o reinado de um único partido e de um ditador já velho de 81 anos.
O início – elas sempre estão começando! – de conversações “indiretas” de paz entre palestinos e israelenses é visto como mais um sucesso parcial dos EUA como pacificadores, não como vergonhoso sinal de que não há qualquer esperança para os palestinos. Mais e mais massacres no Iraque e no Afeganistão são vistos como sinal do “desespero” dos Talibã, não como sinal de que já perdemos “nossa” guerra nos dois países.
Mas as linhas pontilhadas que há entre a Rússia e o Oriente Médio nem são tão profundas nem obscurecem tão completamente a verdade. Há inúmeras razões para que isso aconteça. A velha União Soviética manteve controle mais-que-colonial sobre um punhado de repúblicas muçulmanas – de fato, a Rússia czarista estava lutando na Tchetchnia no século 19. Leiam Haaji Murat[1] de Tolstoi. “Ninguém jamais discutiu o ódio contra os russos”, Tolstoi escreveu dos homens cujos descendentes combateriam o exército de Putin muito mais de um século depois. “O sentimento que todos os tchechnos conhecem, desde a infância, era maior que ódio. Não era ódio. Sequer se reconheciam os cães russos como seres humanos. Era tal nojo, tal repulsa, ante a crueldade irracional daquelas criaturas”. Bem poderia estar escrevendo sobre a fúria incendiária da população de Grozny, ou da fúria selvagem dos afegãos depois da invasão soviética de 1979.
Sim, os russos aprenderam muito no Afeganistão; e a ocupação pelo “nosso” Ocidente, lá, já dura hoje – detalhe que nossos risonhos generais e primeiros-ministros não lhes contarão – mais tempo que a ocupação soviética. Os grandes planos ocidentais para a “Batalha de Kandahar” – batalha que, desconfio, jamais haverá –, são menos ambiciosos que os planos soviéticos para Herat e Kandahar. Mas os russos não esqueceram o que lhes aconteceu.
Bin Laden, uma vez, à minha frente, jactou-se de ter destruído o exército soviético no Afeganistão – no que, sim, há o mérito de boa dose de verdade. Em Moscou, há cinco anos, ouvi veteranos soviéticos do Afeganistão – alguns hoje já devorados pelas drogas – descrever as bombas de fabricação caseira que matavam seus companheiros nas províncias de Helmand e Kandahar, patrulhas soviéticas capturadas cujos soldados eram desmembrados, a pele arrancada, com eles vivos. Os soviéticos, não se pode esquecer, entraram no Afeganistão para defender interesses seus. Brezhnev temia que, se perdesse o aliado comunista em Cabul, ficaria exposto a ataques de muçulmanos dentro da União Soviética –, mas diziam que combatiam para defender o povo contra um governo (claro!) corrupto, e para levar ao Afeganistão a igualdade socialista, sobretudo para distribuir educação e saúde para todos e para treinar o exército afegão. Nem preciso repetir…
Mas os soviéticos acabaram por entender bastante bem o mundo muçulmano — com certeza, a parte árabe daquele mundo. Passaram décadas treinando cada novo ditador para governar como o Kremlin, criando e implantando uma centena de mini-KGBs para esmagar qualquer oposição, inundando-as com armas e aviões, treinando soldados para lutar contra o próprio povo.
E quando Israel venceu em 1967, e novamente venceu em 1973 e outra vez em 1982 (momento memorável do sítio israelense contra Beirute, lembro, aconteceu quando o líder da Frente Democrática para a Libertação da Palestina pediu que Moscou lhes fornecesse armas, a serem entregues por paraquedas dentro da capital libanesa cercada), os russos assistiram à humilhação dos árabes. Diplomatas russos falavam muito melhor árabe que os colegas norte-americanos (o que continua a acontecer até hoje) e entenderam os falsos anúncios de apoio que se esperava que eles – os russos – dessem à “causa” árabe.
Assim, quando o presidente Dmitry Medvedev chegou a Damasco para encontro [retratado na imagem do post] com o presidente Bashar Assad [à direita, na fot0] no início de maio, os árabes o ouviram atentamente, porque ouvir atentamente é típico dos árabes; tanto quanto é típico de nós, ocidentais, não ouvir. Sem nem de longe deixar-se impressionar por “pacificações”, Medvedev declarou que a situação do Oriente Médio era “péssima, muito, muito ruim”, e insistiu que os norte-americanos tomassem “atitude séria”. “Em essência, o processo de paz no Oriente Médio deteriorou-se”, disse ele. “Qualquer aquecimento na situação do Oriente Médio levará a uma explosão e à catástrofe.” Os norte-americanos, por acaso, o ouviram? Não. Nem uma palavra. Não ouviram.
Em vez disso, La Clinton sassaricou diretamente rumo ao Capitólio, para dizer aos legisladores norte-americanos que o novo acordo nuclear Turquia-Brasil-Irã de troca de combustível nuclear não era bom-que-chegue; que as sanções da ONU estavam a caminho – com apoio dos russos. Bom. Isso, ainda teremos de ver, para crer.
Depois desse alerta, o presidente da Rússia – que é membro do infame “Quarteto” supostamente comandando pelo igualmente infame Tony Blair – fez o que Blair e um punhado de diplomatas britânicos já deveriam ter feito há muito tempo: foi visitar Khaled Meshaal, o líder do Hamás que vive em Damasco, e pediu-lhe que libertasse o soldado israelense que permanece prisioneiro em Gaza – jamais até hoje encontrado pelo infalível e valoroso exército de Israel, vale lembrar, apesar de os guerreiros de Israel viverem lá, bombardeando tudo e todos, aquela multidão de famintos e desesperados, já, hoje, há mais de um ano e meio.
Os israelenses não criticaram Medvedev – e teriam criticado se Blair ou Haia ou Obama se desse o trabalho de visitar Meshall. Mas… o ensandecido ministro do Exterior de Israel, Avigdor Lieberman… É russo, o homem, não é?
E então, aconteceu o quê? Medvedev pôs fogo aos gravetos, ao anunciar formalmente a venda de sistemas aéreos de defesa à Síria – mísseis Pantsir terra-ar de curto alcance, baterias antiaéreas e uma frota de aviões bombardeiros Mig-29. No mesmo dia, o que faz Obama? Pede que o Congresso aprove verba de 190 milhões de dólares para o sistema de foguetes de defesa de Israel. Tudo isso, apenas um mês depois de o presidente Shimon Peres, de Israel, ter dito – e apesar de os norte-americanos não terem acreditado, mesmo que nada pudessem dizer contra os argumentos israelenses – que a Síria teria mandado enormes (e ultrapassados) mísseis Scud para o Hizbollah no Líbano.
Esses velhos mísseis paquidérmicos de nada serviriam ao Hizbollah, apesar de o Hizbollah – que já declarou ter 20 mil foguetes prontos, engatilhados e mirados para atacar Israel – não se ter dado o trabalho de desmentir as tolices sobre os Scud.
O vasto desperdício de dinheiro que consome EUA e Rússia e também a Síria – embora não consuma os israelenses, cuja economia flutua acima do mundo, apoiada no sustento financeiro que recebe dos EUA – continua, simplesmente, invisível, no Ocidente, onde todos continuamos a jogar joguinhos de “sanções” da ONU e preocupações com a “segurança” de Israel (e nenhuma preocupação com a “segurança” dos palestinos). E para quem Obama desenrola seu tapete vermelho – muito literalmente? Para o corrupto e corruptor Hamid Karzai.
Por quê, ah, mas, por quê, pergunto e pergunto a mim mesmo, Obama – que gastou meses e meses debatendo o tal “surge” (e como odeio essa palavra!) no Afeganistão – não convoca todos os seus “especialistas” em política externa e, afinal, se dispõe a aprender um pouco sobre a infinita tragédia, cada dia maior, de toda essa região? Do mar ao mar brilhante, coast to coast, os EUA mantêm legiões de departamentos de “Estudos do Oriente Médio”, “Estudos Islâmicos”, “Estudos Hebraicos”, “Estudos Árabes” – e nada, do saber que lá haja, é jamais utilizado. Por que não?
Porque os “especialistas” em política externa – e seus horríveis clones na CNN, Fox News, ABC, NBC, CBS  etc. – não têm interesse em partilhar gratuitamente o que sabem. Onde se escreve “Harvard”, leia-se o Brookings Institute; em “Berkeley”, leia-se a Rand Corporation etc., etc.
E o que jaz por trás disso? Recorro ao meu velho camarada John Mearsheimer, coautor de The Israel Lobby and US Foreign Policy que se tornou best-seller também entre os norte-americanos comuns – apesar das crises de ira de Alan Dershowitz (aquele, que cometeu a infâmia de dizer que “O juiz Goldstone é agente do mal”) – e que acaba de publicar outro valente artigo sobre a influência daninha que o lobbylobby do partido Likud, mas esqueçam esse detalhe, por ora. pró-Israel exerce em Washington; de fato, é o
Mearsheimer diz que o presidente Barack Obama conseguiu “finalmente arrastar Israel e os palestinos de volta à mesa de negociações”, na esperança de que essas negociações levem à criação de um Estado palestino em Gaza e na Cisjordânia. “Infelizmente, nada disso acontecerá,” diz Mearsheimer. “Em vez de criar-se um Estado palestino, o mais provável é que os territórios ocupados sejam incorporados a uma ‘Grande Israel” que, então, converter-se-á em Estado de apartheid, em tudo semelhante à África do Sul governada por minoria branca”.
Nenhum presidente norte-americano pode obrigar Israel a mudar suas políticas para os palestinos. Mearsheimer não poupa palavras. “A principal causa disso é o lobby israelense, poderosa coalizão de judeus norte-americanos e cristãos evangélicos que tem profunda influência na política dos EUA para o Oriente Médio. Alan Dershowitz – sim, sim, o mesmo – “acertou ao dizer que “Minha geração de judeus (…) tornou-se parte do que talvez seja o mais efetivo movimento de lobby e arrecadação de dinheiro, de toda a história da democracia.”
Não é a primeira vez que um intelectual norte-americano fala tão claramente. Desde 1967, todos os presidentes dos EUA opuseram-se à colonização ilegal de terra dos árabes, pelos israelenses, na Cisjordânia. Todos fracassaram. Obama fracassará, como os demais. Depois de eleito, Obama pediu o fim daquelas colônias. Netanyahu mandou-o às favas. Obama – Mearsheimer procurou atentamente a palavra – “desabou”. Quando Obama pediu o fim das construções em Jerusalém Leste, Netanyahu disse que Israel jamais pararia de construir ali, porque seria “parte integral do Estado judeu.” Obama afundou ainda mais.
Netanyahu continua a repetir que não parará de construir naquela parte de Jerusalém com que os palestinos contam para ser sua capital. Obama já nem responde. E ninguém espere, nem por um segundo, que La Clinton responderá – ela tem planos para ser a próxima presidente, depois de Obama.
O vício da atitude dos europeus é que eles tampouco farão qualquer coisa contra Israel porque – essa a sublime e falsa mensagem de todos os ministros do Exterior da União Europeia – os EUA é que têm “ascendência” sobre Israel. Sim, é possível que os EUA tivessem alguma ascendência sobre Israel – dadas os maciços subsídios econômicos, dos quais vive o Estado judeu –, mas não têm. Porque, como diz Mearsheimer, o lobby comanda toda a política dos EUA para o Oriente Médio. Nada disso deve sugerir que haveria algum tipo de “conspiração” de judeus; isso significa apenas que o lobby Likud-Israel priva os EUA de todos os direitos de independência como negociador; e emascula todas as políticas norte-americanas, ao mesmo tempo em que faz aumentar o risco para os EUA, em todas as políticas para toda a região.
O ex-primeiro-ministro de Israel Ehud Olmert – o qual, como vários outros ex-ministros e presidentes vive de repetir truísmos quando já não tem poder para fazer valer qualquer verdade – diz que se a Solução dos Dois Estados fracassar (e fracassará, com toda a certeza), “Israel enfrentará conflito semelhante ao que a África do Sul enfrentou” e que, “quando isso acontecer, será o fim de Israel”. Mearsheimer conclui que “o lobby nos EUA está, de fato, trabalhando a favor da destruição de Israel como Estado judeu”.
E nós, o que fazemos? Continuamos a apoiar todos os ditadores criminosos e potentados na região, encorajando-os a confiar nos EUA, a fazer mais concessões a Israel, e a manter o povo subjugado. Vez ou outra, pedimos que sejam “mais democráticos”. Foi ideia de George W. Bush – para a qual contribuiu sua esposa, que acreditava que o rei Abdullah da Jordânia e sua rainha seriam bons exemplos de democratas – e, isso, numa democracia sem Constituição! Às vezes, surpreendo-me com a ironia – e a hipocrisia – de haver países europeus empenhados em exigir democracia dos árabes.
Queremos espalhar “parlamentinhos à inglesa” por todo o Oriente Médio, em tempos em que a maioria dos países da União Europeia vão-se convertendo em nações presidencialistas. O prestígio da Real “House of Commons” vem-se deteriorando há anos – nenhum jornal britânico tem coluna dedicada ao Parlamento, por exemplo – e a síndrome dos Blair-istas tem muito a ver com isso. Talvez aí esteja a razão pela qual esse ser em ruínas não trabalha muito a favor da democracia no Oriente Médio.
Sim, e é tudo verdade. Os governantes árabes estão tão seguros deles mesmos, que hoje gritam “bu!” à Mamãe Gansa dos ovos de ouro dos mercados “ocidentais”. Quando o governo Obama criticou a decisão do presidente egípicio  Hosni Mubarak, de manter a legislação de emergência que já dura 30 anos (Clinton disse que a prorrogação ignorava “vasta gama de vozes egípcias”) –, o ministro do Exterior egípcio respondeu, sem pestanejar, que a questão estava “superpolitizada” e que a crítica vinha só da mídia dos EUA e de grupos de direitos humanos. Acertou na mosca, quanto à segunda parte.
Então, estaria chegando ao fim o século norte-americano? Desgraçadamente, ainda não. Talvez se corrijam algumas das ilusões ocidentais sobre o Oriente. Talvez os recentes ataques no Iraque e os mais espetaculares no Afeganistão, inclusive o espantoso ataque à base aérea de Bagram – e eu que supunha que estivéssemos combatendo a Batalha de Kandahar, não a Batalha de Bagram! – nos obriguem a ver mais verdades. Que o povo muçulmano – não os políticos corruptos – não pode ser derrotado e não será derrotado, mesmo que a guerrilha contra o Ocidente seja tão atrasada quanto violenta. Mas estaremos aprendendo alguma coisa? Os EUA mandam nuvens de aviões-robôs não tripulados ao Paquistão, cobrem de mísseis o Waziristão, e um paquistanês naturalizado norte-americano tenta fazer explodir um carro na Times Square para vingar-se – e os norte-americanos, para vingar-se da vingança, usam os aviões-robôs e matam mais 15 homens no Paquistão e… Os leitores podem completar a frase.
Não bastasse tudo isso, insistimos em escrever nossa história preventiva extraordinária desse conflito massivo. Sempre penso em como fomos à guerra na Irlanda do Norte no início dos anos 1970s. Nós jornalistas chegamos lá com ralo conhecimento histórico, pouco mais que a imagem dos quadrinhos da Punch, do irlandês bêbado, armado com cassetete, ansioso por matar sem qualquer motivo todos os gentlemen ingleses que invadissem seu país – e uma vaga memória de que a Irlanda Católica se mantivera neutra na II Guerra Mundial (o que é verdade); que o líder irlandês Éamon de Valera fizera visita de pêsames à representação alemã depois da morte de Hitler (o que é verdade); que irlandeses reabasteciam os barcos U alemães (o que é falso).
Os muçulmanos estão em situação semelhante; acreditamos que querem islamizar o Ocidente (o que é falso); que querem se expandir para o Oeste – é falso: fizeram isso quando quiseram, na Andaluzia –; que querem se expandir pela espada. Será que há quem acredite que a Indonésia, a maior nação muçulmana do mundo, foi invadida por árabes?
E há o conto da II Guerra Mundial – que os árabes teriam sido pró-nazistas. Bem, é verdade que o Grande Mufti de Jerusalém encontrou-se com Hitler e fez várias infelizes proclamações contra os judeus, embora nunca – ao contrário do que reza a propaganda israelense – tenha visitado Auschwitz. Também é verdade que Anwar Sadat trabalhou como espião para Rommel no Egito – e muito teria festejado se a Wehrmacht tivesse avançado até a Palestina. Mas depois se tornou o melhor amigo árabe que Israel jamais teve, convidado a Jerusalém quando quis fazer a paz.
Mas os preconceitos ocidentais vão muito mais longe, no tempo – até os dias em que usávamos a palavra “turco” em vez de “muçulmano”. Na Itália, antes do século 16, “turco” era palavrão. Um diplomata sueco, Ingmar Karlsson, descobriu, ao pesquisar para uma conferência que fez em Istanbul em 2005, que os italianos têm a expressão “puzza comme un turco”, “fede como um turco”. Hoje, os ingleses ainda dizem “fala de turco” e meu próprio dicionário escolar Random House American College Dictionary de 1949 define “turk” como “pessoa tirânica, bárbara ou muito cruel”.
E assim vamos, sem esquecer a pequena ajuda do amado Papa em Regensburg. Apesar de os árabes terem sido imperadores de Roma e de terem visitado o Ocidente antes de nós, ocidentais. Quando Vasco da Gama “descobriu” a Índia e chegou a Calicut (Calcutá), no dia 20/5/1498 – devo essa história, provavelmente apócrifa, a Warwick Ball em seu notável Out of Arabia – foi recepcionado por um árabe da Tunísia com as palavras “Que o diabo o carregue! O que veio fazer aqui?” Mas crônica contemporânea de Hadramaut (em nossos dias, o Iêmen) descreve o modo como apareceram, um belo dia, as naves francesas, a caminho da Índia. “Tomaram logo sete barcos (árabes), mataram todos a bordo e fizeram alguns prisioneiros. Foi o primeiro feito deles, malditos sejam!” Os europeus estavam chegando ao Oceano Índico, e já pensávamos que os árabes estariam tentando entrar na Europa.
Vai ver, essa é a linha pontilhada original. Ou teriam sido as Cruzadas? Ou o Império Otomano – lembram que a Turquia foi “o doente da Europa”? – ou as mentiras que contamos aos árabes, sobre a Palestina? Ou a revolução iraniana? Ou o quanto nós, europeus, demos apoio incondicional a Israel? E todos os ditadores que introduzimos e apoiamos? Mas é tempo de nos livrarmos de todas as linhas divisórias, ver a realidade e ouvir – tenho mesmo de repetir? – Dmitry Medvedev e seus assemelhados.

Um abraço, blarg, e até!

sexta-feira, 30 de julho de 2010

O Réu?!?!

Olá!

Que me conhece sabe da minha admiração pelo José Dirceu e da minha indignação pelo seu caçamento como parlamentar. Pois bem, cunhei esta estrevista feita, com o "companheiro", pela Jornalista Priscila Gorzoni para a Revista Ciência & Vida - Sociologia. Segue a entrevistra na íntegra.

À espera de seu julgamento, previsto para 2011, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu fala sobre sua trajetória política e revela ansiedade pela decisão do Supremo Tribunal Federal

Nascido em Passa Quatro, uma pequena cidade do interior de Minas Gerais, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu de Oliveira e Silva apaixonou-se cedo pela política. Formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), teve destacada atuação como liderança do movimento estudantil nos "anos de chumbo" da ditadura militar. No dia 12 de outubro de 1968, durante o 30º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), realizado em um sítio de Ibiúna-SP, Dirceu acabou preso e conduzido para o Departamento de Ordem Política e Social (DOPS).

No início de setembro de 1969, em troca da libertação do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick, sequestrado por integrantes das organizações guerrilheiras de esquerda Ação Libertadora Nacional (ALN) e Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), Dirceu e mais 14 presos políticos foram libertados pelos militares e expulsos do país. "Cassaram a minha nacionalidade, me baniram do país", afirma Dirceu, que exilou-se em Cuba e retornou na condição de clandestino para o Brasil. Após a anistia, ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores, em 1980. Eleito deputado federal, participou da CPI que levou ao impeachment e à suspensão dos direitos políticos do então presidente Fernando Collor de Mello.

Quando Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente da República em 2002, José Dirceu logo assumiu uma posição de protagonismo em Brasília. Nomeado ministro-chefe da Casa Civil, era o homem forte do Governo Lula até as denúncias do deputado federal Roberto Jefferson provocarem uma grande crise política, que culminou com a sua saída da equipe ministerial e a cassação do seu mandato de deputado federal.

Nesta entrevista exclusiva para a revista Sociologia Ciência & Vida, José Dirceu conta como entrou para a política, relembra sua vida em Cuba, faz sua avaliação do caso PC Farias e do episódio de sua cassação em 2005.

Você nasceu na cidade de Passa Quatro, no interior de Minas Gerais. Lá, você já tinha contato com a política? Mostrava inclinação para essa vocação?Conte sobre o seu primeiro contato com a política e a militância na esquerda. Quais fatores ali podem ter influenciado sua trajetória política?

Meu pai era civilista, da ala do deputado Bilac Pinto (UDN-MG), e rompeu com o golpe na hora que a ditadura cortou figuras como o Lacerda e o Magalhães Pinto. Uma ala da UDN, partido extinto pelo AI-2 em 1965, se descolou e foi para a Frente Ampla, a união do JK, do Jango e do Lacerda, que foi extinta por decreto pela ditadura. Convivi com a política em casa, desde cedo. O sócio do meu pai na gráfica era do PTB, getulista. Aprendi a conviver com a diversidade desde criança.

"DESENCADEAMOS UMA REVOLUÇÃO CULTURAL QUE PODERIA SE COMPARAR À SEMANA DE ARTE MODERNA SE NÃO TIVESSE SIDO TOLHIDA PELO AI-5. EM 1968, VIMOS SURGIR UM BRASIL URBANO E UMA GERAÇÃO JOVEM QUE TRABALHA E É INDEPENDENTE DOS PAIS"

Você se formou em Direito na PUC. O que o levou a fazer este curso? Detalhe sua liderança política naquela época.

Minha opção pelo Direito foi por via política. Queria estudar direito constitucional e internacional, além de penal. Na faculdade, me dei conta de que os professores ensinavam como se vivêssemos numa democracia e não falavam da ditadura, dos Atos Institucionais 1 e 2, da repressão, das cassações, da censura, das prisões, da proibição de greves e manifestações, do fim das eleições diretas. Comecei a protestar e a militar, a reativar o Centro Acadêmico, a participar de cineclubes, feiras de livro, reuniões e debates. Tudo proibido pela ditadura.

Depois participei das lutas contra o aumento das anuidades, pela reabertura da UNE e das UEEs, as uniões estaduais de estudantes, e dos centros acadêmicos, até ser eleito presidente do CA 22 de Agosto, da minha faculdade, a PUC de São Paulo, e depois da UEE de São Paulo. Comecei a liderar minha classe e depois de participar de todas as lutas, aos poucos fui aprendendo com as lideranças de antes do golpe. Me filiei ao PCB [Partido Comunista Brasileiro] e depois à dissidência estudantil do PCB. Me lembro que quando entrei na faculdade de Direito da PUC, em 1965, encontrei um cemitério. Fui um daqueles jovens que se opunham ao golpe militar dado um ano antes e um militante do movimento estudantil e da rebelião de uma geração contra toda uma estrutura moral e de comportamento.

Desencadeamos uma revolução cultural que poderia se comparar à Semana de Arte Moderna se não tivesse sido tolhida pelo AI-5. Em 1968, vimos surgir um Brasil urbano e uma geração jovem que trabalha e é independente dos pais. Começou a surgir um Brasil rebelde e libertário que misturava, por exemplo, as elites com as classes populares nas universidades. Quando ingressei nessa luta, o movimento estudantil vivia um cenário desolador: o golpe militar desfechado um ano antes fechara a maioria dos centros acadêmicos e instituições de movimentos sindical e popular, estabelecera censura (ainda que não institucionalizada) e até índex de livros proibidos.

O Brasil vivia o auge da repressão. Fale sobre a famosa Batalha da Maria Antonia.

A repressão permeava tudo: o ensino, a relação com os professores, a discriminação às mulheres, os movimentos e agremiações sociais e populares, enfim, toda a vida nacional. Da revolta contra essa opressão e contra os padrões conservadores, nasceu, efetivamente, minha atuação política. Fui um dos participantes da batalha da rua Maria Antonia, em 3 de outubro de 1968, o histórico, gravíssimo e sangrento confronto entre estudantes da Faculdade de Filosofia da USP [Universidade de São Paulo] e uma minoria de estudantes da Universidade Mackenzie, este lado com o apoio de agentes infiltrados do DOPS e de membros do Comando de Caça aos Comunistas (CCC). O conflito, forjado para justificar a ocupação da Faculdade de Filosofia da USP, principal polo do movimento estudantil paulista, culminou na morte do secundarista José Carlos Guimarães, assassinado à bala pela repressão aos 20 anos. Após esse triste episódio, fizemos clandestinamente o 30º Congresso da UNE, em Ibiúna. "Caímos". Os registros da mídia variam, mas o nosso cálculo é que mais de 800 estudantes foram presos, entre os quais eu.

Você foi um dos quinze presos liberados por exigência do sequestro do embaixador norte-americano. Por favor, relate como foram essas negociações e o que chegou até você nessa época. Qual era a sua relação com o grupo que sequestrou o embaixador?

Quando fomos presos durante o Congresso da UNE, primeiro fomos levados para o Forte de Itaipu, na Praia Grande, que na época era comandado pelo então tenente-coronel Erasmo Dias. Em seguida, fomos para o 2º BC em São Vicente, e depois passamos por uma delegacia na rua Onze de Junho, e pelo quartel do Exército em Quitaúna, bairro de Osasco. Lá eu fiquei sabendo por um preso que chamávamos de Cabeleira que seria um dos 15 presos políticos trocados pela libertação do embaixador americano Charles Burke Elbrick, e banido do país. Cassaram a minha nacionalidade, me baniram do país e me colocaram em um avião para o México.

Fui recebido com outros companheiros pelo governo mexicano. Ficamos em um hotel que existe até hoje lá, no centro da Cidade do México.Depois de um mês, fomos para Havana, onde éramos hóspedes do governo cubano. Não tínhamos informações sobre as negociações, e minha relação com a ALN era política. A não ser pela presença na sua direção e nos grupos de combate de dezenas de companheiros que haviam lutado comigo no movimento estudantil, eu não tinha contato e não era militante da organização de Marighella. Alguns deles reencontrei em Cuba, daí a razão da minha ida para a Casa dos 28, onde me integrei ao grupo que estava em Cuba pela ALN para treinamento militar.

"VIVI O EXÍLIO E A CLANDESTINIDADE E, NAS DUAS SITUAÇÕES, A REPRESSÃO, O ENDURECIMENTO DA DITADURA, AS MORTES E DESAPARECIMENTOS POLÍTICOS PROVOCADOS PELA DITADURA, A PRISÃO E TORTURA INFRINGIDAS AOS IDEALISTAS QUE RESISTIAM À DITADURA, E A SAGA DOS MILHARES DE BRASILEIROS QUE, COMO EU, FORAM OBRIGADOS A SE EXILAR"


Durante o exílio em Cuba, como era a sua vida no país? Como era o seu relacionamento com os parentes e colegas no Brasil, e quais foram os momentos mais marcantes dessa fase? Depois, você voltou ao Brasil duas vezes clandestinamente. Como foram esses retornos?


Vivi o exílio e a clandestinidade e, nas duas situações, a repressão, o endurecimento da ditadura, as mortes e desaparecimentos políticos provocados pela ditadura, a prisão e tortura infringidas aos idealistas que resistiam à ditadura, e a saga dos milhares de brasileiros que, como eu, foram obrigados a se exilar. Em Cuba reencontrei os companheiros da Ação Libertadora Nacional e comecei a fazer treinamento militar. Lá, estudei e trabalhei quando não estava fazendo treinamento ou me preparando para voltar ao Brasil.

Nunca mantive contato com minha família durante o exílio e a clandestinidade, a não ser para avisar que estava vivo. De volta ao Brasil, lutei na clandestinidade entre 1971 e 1972. Sem condições de permanecer no país, voltei para Cuba por decisão de minha organização, o MOLIPO [Movimento de Libertação Popular]. E vivi também clandestinamente em Cruzeiro do Oeste, no Paraná, de 1975 a 1980, onde me casei com Clara Becker e tive um filho, José Carlos, hoje prefeito da cidade. Com a anistia em 1979, voltei à atuação política normal, ajudei a fundar e a organizar o PT. Durante os anos que vivi no Paraná, aproveitei para conhecer o Brasil e estudar, ler, viajar. Só voltei a fazer contatos políticos no meio do ano de 1979, quando já estava claro que a anistia viria graças à luta democrática dirigida pelo MDB e à ascensão das greves operárias lideradas por Lula.
Você foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores. Explique-nos sobre o início da formação desse partido e quais eram as maiores dificuldades. Fale sobre a sua atuação no partido no início e nos últimos tempos antes de sua cassação, em 2005.

Com a anistia e o início da redemocratização, assim como eu, muitos militantes de esquerda, de vários grupos, da luta política e da luta sindical, sentíamos a necessidade de nos organizarmos em um partido que representasse os interesses dos setores progressistas e, principalmente, os interesses do povo brasileiro, do trabalhador brasileiro. Havia um movimento sindical belíssimo no ABCD paulista, que foi berço para esse partido.

Esse ideário de transformação, de construção do socialismo e de transformação ética da sociedade também cativou setores progressistas da classe média, da Igreja e mesmo do empresariado. Fui um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores, fui seu dirigente por anos. De 1981 a 1983, fui secretário de Formação Política do PT paulista; de 1983 a 1987, secretário-geral do seu Diretório Regional; e de 1987 a 1993 fui secretário-geral do Diretório Nacional. Em 1986 fui eleito deputado estadual em São Paulo. Em 1990, fui eleito deputado federal e em 1994, disputei o governo de São Paulo, recebendo dois milhões de votos.

Voltei a ser eleito deputado federal em 1998 e 2002, quando fui o segundo mais votado do país. Em 1995, assumi a presidência do PT, sendo reeleito por três vezes. Na última, em 2001, fui escolhido diretamente pelos filiados em um processo inédito no Brasil de eleições diretas para todas as direções de um partido político, e ocupei a função até 2002, quando me licenciei para participar do governo do presidente Lula. Fui integrante da coordenação das campanhas de Lula à presidência em 1989, 1994 e 1998, tendo sido o coordenador-geral em 2002. Com a vitória de Lula, assumi a função de coordenador político da equipe de transição. Quando o presidente assumiu, fui nomeado ministro da Casa Civil, cargo que ocupei de janeiro de 2003 a junho de 2005.

Você participou ativamente da CPI que levou a saída do então presidente Fernando Collor de Mello. Como avaliaria hoje o caso PC Farias?

Na Câmara dos Deputados, assinei, com Eduardo Suplicy, requerimento propondo a "CPI do PC" (Paulo César Farias), que levou ao impeachment do presidente Fernando Collor de Mello. Mas o que pedi era investigação para os fatos que se denunciavam à época. Collor renunciou para não ser cassado, para não ser condenado num julgamento político, e depois foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal. Como avalio hoje? Hoje, o ex-presidente Collor, depois de cumprir dez anos de suspensão de seus direitos políticos, é senador pelo seu Estado, Alagoas. Assim, acredito que respondeu por seus atos com a cassação e a suspensão dos direitos políticos por dez anos.
Durante o processo que culminou com a sua cassação, em 2005, como você enfrentou as acusações? Hoje, de que forma você analisa essas acusações e o que faria de diferente se pudesse voltar no tempo?

Logo após as entrevistas de Roberto Jefferson para a "Folha" e, principalmente depois que o "Estadão" sugeriu a ele a ideia - e ele comprou - de me apontar como "chefe da quadrilha", eu sabia que seria cassado, sabia que a Câmara teria de dar uma resposta e que a oposição não perderia a oportunidade de fazer tudo para me tirar o mandato. Nesse período, entre as denúncias e a votação da perda do mandato, eu fiz minha defesa com todas as forças, mas também me preparei para a vida longe do Executivo e do Legislativo. Mais ainda, me preparei para enfrentar os próximos anos à espera do julgamento no Supremo Tribunal Federal, que deve acontecer em 2011.

Se considerarmos que o processo de cassação foi em 2005, posso dizer que falta pouco. No mais, já fui absolvido em ação de improbidade administrativa que corre na Justiça Federal em Brasília; todas as seis investigações abertas no chamado caso Waldomiro Diniz - duas CPIs, dois inquéritos policiais e dois procedimentos do MP - nada apontaram contra mim e nem arrolado como testemunha eu fui; e sobrevivi a uma devassa de 17 meses feita pela Receita Federal, que não encontrou nada de irregular nas minhas contas, principalmente no que se refere à variação patrimonial incompatível. Praticamente recebi um atestado de idoneidade. Só resta aguardar o julgamento no Supremo.

Quais são seus planos futuros?

Neste momento, aguardo ansiosamente meu julgamento no Supremo Tribunal Federal.


Um abraço, Blah e até!